No dia da Consagração ao Imaculado Coração de Maria

25-03-2022

ANUNCIAÇÃO DO SENHOR

Consagração do Mundo ao Imaculado Coração de Maria

25 de Março de 2022


"Pede um sinal ao Senhor"

1. "Pede um sinal ao Senhor teu Deus, quer nas profundezas do abismo, quer lá em cima nas alturas": com estas palavras, o Profeta Isaías convidou o rei Acaz a confiar plenamente no Senhor. Em meados do séc. VIII a. C., Jerusalém viu-se ameaçada por dois outros povos. Diante de Acaz está um dilema: confiar no Senhor, como o convida o Profeta, ou pedir auxílio à Assíria, ficando vassalo do seu rei e perdendo a independência, subjugado a um poder e a um deus estrangeiro.

O rei irá escolher a opção humanamente mais segura. Irá recusar o salto da fé a que o Profeta convidava. Mesmo depois do sinal que Deus lhe enviara: a sua esposa estava grávida! Era o sinal de que Deus não abandona o seu povo; sinal de que Deus cuidaria de Jerusalém até ao final. Acaz recusou a palavra do Profeta e o sinal de Deus. Fê-lo, não apenas por causa de um raciocínio humano, segundo o qual a aliança com a Assíria constituía a opção mais segura: fê-lo disfarçado de motivos religiosos: "Não pedirei, não porei o Senhor à prova". Como que dizendo de modo hipócrita: Não vou exigir do Senhor um sinal, isso é contra a própria fé.

Mesmo assim, Deus insiste em mostrar ao rei o caminho; em mostrar a sua proximidade e presença; em mostrar o poder com que conduz o decorrer dos acontecimentos. Mas sabemos como Acaz insistirá na sua falta de fé, no seu pecado. Mais que confiar em Deus, confiou no poder das armas.


2. As palavras do Profeta Isaías, apesar de se cumprirem com o nascimento de Ezequias, filho de Acaz, continuaram a ser olhadas como fonte de revelação - quer dizer: como palavras de Deus que não esgotam a sua capacidade de iluminar a história apenas num determinado momento, mas antes continuam com todo o seu vigor ao longo dos tempos.

Por isso, a tradição cristã viu-as plenamente cumpridas apenas em Jesus Cristo. Como afirma o evangelista Mateus, ao narrar o mistério da encarnação: "Tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que o Senhor tinha dito pelo Profeta: «Eis que a Virgem conceberá e dará à luz um filho, a quem porão o nome de Emmanuel»" (Mt 1,22-23).

Jesus é o verdadeiro Emmanuel, o verdadeiro "Deus connosco", Deus no meio de nós - presente não apenas quando o Verbo se fez Homem e caminhava pela Galileia e pela Judeia, mas presente, Deus-connosco, também hoje, no nosso tempo.

Acaz recusou arriscar o passo da fé. Ao contrário, a jovem, a Virgem Maria, aceitou esse mesmo passo, deixando que toda a sua existência passasse a ser determinada por esse "Deus connosco": "Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra".

Por isso também, a Virgem Maria se tornou, ela própria, um sinal - não apenas para os cristãos dos primeiros anos, mas para todos os cristãos, de todos os tempos e lugares, e mesmo para o mundo inteiro. Um sinal de fé: da fé enquanto atitude de vida daquele que aceita a proximidade e a presença de Deus; daquele que aceita que a sua relação com Deus determine e ilumine toda a sua existência. Que o mesmo é dizer: daquele que se encontra disponível para que a Palavra se continue a fazer carne. Ou melhor: disponível para que a nossa carne de seres humanos, frágeis e pecadores, continue hoje a proclamar a palavra, o amor de Deus, a ser sua presença e sinal erguido do seu amor por nós e por todos. Sinal do amor que ultrapassa o medo; sinal da proximidade divina que ajuda a olhar bem mais longe que os limites humanos, sempre estreitos e finitos.

3. Foi como sinal de Deus e convite à fé que, em 1917, estando a humanidade a viver um dos piores momentos da sua história - uma Guerra Mundial - a Virgem Maria apareceu em Fátima a três pastorinhos. Sabemos como, durante a sua aparição de Julho, a Senhora disse aos pastorinhos: "Visteis o inferno, para onde vão as almas do pobres pecadores; para as salvar, Deus quer estabelecer no mundo a devoção a meu Imaculado Coração. Se fizerem o que eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz: mas se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior. [...] Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia ao Meu Imaculado Coração, e a comunhão reparadora dos primeiros sábados. Se atenderem a meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz" (Memórias da Irmã Lúcia, IV,74-75).

Sabemos que, de acordo com a Irmã Lúcia, S. João Paulo II, em 25 de Março de 1984, realizou plenamente a consagração pedida por Nossa Senhora em Fátima, unido a todos os bispos do mundo.

Mas também hoje, a pedido do Papa Francisco, uma vez mais, os bispos católicos de todo o mundo renovam esta consagração, batendo à porta do Coração Imaculado de Maria: "Ó Mãe de Deus e nossa, solenemente confiamos e consagramos ao vosso Imaculado Coração nós mesmos, a Igreja e a humanidade inteira, de modo especial a Rússia e a Ucrânia. Acolhei este nosso acto que realizamos com confiança e amor, fazei que cesse a guerra, providenciai ao mundo a paz. O sim que brotou do vosso coração, abriu as portas da história ao Príncipe da Paz; confiamos que mais uma vez, por meio do Vosso Coração, virá a paz. Assim, a Vós consagramos o futuro da família humana inteira, as necessidades e os anseios dos povos, as angústias e as esperanças do mundo".

4. Como é conhecido de todos, tive ontem a graça de abrir um tempo jubilar para a nossa Diocese, concedido também pelo Santo Padre, para vivermos a indulgência - a misericórdia, o amor divino - ao celebrarmos o centenário do falecimento do Beato Carlos de Áustria. Também ele, fervoroso devoto de Nossa Senhora, procurou ao longo da sua vida mas, sobretudo, no decorrer da Iª Guerra Mundial, instaurar a paz.

Faz, por isso, também ele, parte deste inumerável conjunto de sinais que nos são dados. Sinais que nos convidam a confiar em Deus; sinais que nos convidam a construir a paz; sinais que nos mostram como só no Deus connosco que é Jesus encontramos a verdadeira salvação e o futuro de toda a humanidade.

Neste dia e sempre, façamos subir a Deus a nossa oração. Peçamos que Ele nos dê a graça da paz. E, ao contrário do rei de Judá, que Ele nos encontre disponíveis para, como a Virgem Maria, dizermos por palavras e em atitudes de vida: "Faça-se em mim segundo a tua palavra".

+ Nuno, Bispo do Funchal