Homilia Abertura Congresso 100 Anos das Irmãs Apresentação de Maria

06-07-2025
Foto de Duarte Gomes
Foto de Duarte Gomes

XIV Domingo do Tempo Comum (C)

Congresso Educação, Solidariedade e Evangelização
100 Anos da Chegada das Irmãs da Apresentação

Sé, 06 de Junho de 2025

"O que tem valor é a nova criatura"

1. "Nem a circuncisão nem a incircuncisão valem alguma coisa; o que tem valor é a nova criatura" (Gal 6,15). Estas palavras da Carta aos Gálatas, que acabámos de escutar, podem bem ser tomadas como a base de toda a evangelização, bem como da acção educativa cristã. E devemos tomá-las a sério.

Aos cristãos da Galácia (situada na Turquia de hoje) que, depois de terem acolhido de modo entusiástico o Evangelho pregado por S. Paulo, rapidamente o esqueceram para regressarem aos esquemas velhos da circuncisão e da Lei — da justiça retributiva —, o Apóstolo recorda Jesus Cristo, o Homem novo, a graça e a liberdade que dele nos vêm.

De facto, é muito fácil regressar aos velhos esquemas humanos, mesmo depois de termos experimentado a novidade verdadeira que é a vida com Jesus. Experimentamo-lo todos nós, em cada dia que passa, quando recaímos, uma e outra vez, na velhice do pecado: o velho esquema dos méritos e da Lei de Moisés; o esquema das conquistas humanas e das glórias pessoais estão demasiado enraizados em nós para nos livrarmos deles com facilidade.

Na evangelização, facilmente recaímos numa religiosidade espontânea, naquilo que a nós parece bem e justo: esquemas velhos de um Deus que se limita a recompensar a virtude e a castigar o pecado — sendo que tomamos como "virtude" o modo como procedemos, enquanto classificamos "pecado" as opiniões daqueles que discordam de nós ou que se afastam daquilo que julgamos ser o certo. Facilmente nos tornamos o critério do bem e do mal.

Como é difícil tomar a sério e viver na ordem da graça, do amor transformador e exigente — exigentíssimo! — que é a novidade de Cristo!

Deus, que é Amor, não pactua com o ódio e com a guerra, com a mentira e com todos os demais esquemas humanos. Deus é bem maior que o "deve" e o "haver" dos homens: é Jesus de Nazaré, morto e ressuscitado, Homem Novo, que leva a Lei ao seu pleno cumprimento, e que infinitamente a ultrapassa. Deixar, favorecer, querer, desejar que em nós (em cada um de nós e na sociedade em que vivemos) neste mundo que é o nosso, Jesus, o Homem novo, se vá formando: esse é o objectivo da evangelização, de toda a qualquer evangelização. É desse modo que Deus é conhecido e reconhecido; é desse modo que empreendemos o caminho para o céu — e a ele conduzimos tudo quanto nos rodeia.

2. Mas se é assim no anúncio do Evangelho, muito mais o devemos dizer na tarefa educativa cristã.

Também nesta facilmente caímos na formatação dos mais novos de acordo com aquilo que pensamos, com os métodos e objectivos que usaram connosco, ou mesmo com os inovadores objectivos de uma qualquer teoria pedagógica. Facilmente caímos nos méritos, nas conquistas pessoais, nas vitórias de quem, oferecendo-se generosamente para ser uma "locomotiva do universo", é louvado pelo que fez, pelo que sabe e pelo que descobriu. Educamos vencedores, mas não homens novos! Fabricamos heróis mas não formamos cristãos!

Terá que ser, necessariamente, desse modo? A isso parecem obrigar as teorias pedagógicas (que procuram fabricar vencedores de si mesmos ou da sociedade), bem como as exigências legislativas. Darão origem a colégios eficientes, com bons resultados em rankings — escolas que, certamente, nos orgulham (isso mesmo: nos "orgulham"!…) e que havemos de apresentar com exemplo do nosso contributo para a sociedade. E são-no, de verdade, pois que também pela excelência do conhecimento humano passa o homem novo que é Jesus. Mas, se virmos bem, a nós, cristãos, isso não nos pode bastar. Falta-lhe a novidade humana e divina de Jesus.

3. Perdoai que vos fale agora a jeito de profeta (que tenho obrigação de ser), mais a partir da palavra de Deus e do sonho divino para este nosso mundo — sonho que é realidade concreta e concretizada em Nosso Senhor Jesus Cristo e na Virgem Maria, e em tantos outros santos (também em Santa Maria Rivier) —; deixai que fale mais a partir do sonho de Deus, dizia, que a partir dos esquemas deste nosso mundo.

Que é a educação numa perspectiva cristã? É a formação da pessoa de Jesus ressuscitado num ser humano. "Meus filhos, por quem sofro de novo as dores de parto, até que Cristo esteja formado em vós!…" (Gal 4,19) — tinha antes escrito S. Paulo, comparando-se à mãe que sofre pelo fruto das suas entranhas, não apenas quando o dá à luz mas ao longo de toda a existência, ao longo de toda uma vida… "até que Cristo seja formado" em seu filho.

Dar a alguém a forma de Cristo: este é o sucesso da educação cristã. O mesmo é dizer: ajudar o educando a pensar segundo os critérios de Cristo; a agir com a ousadia de Cristo; a sentir com o coração de Jesus! "Com Cristo estou crucificado. Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. O que agora vivo na carne, vivo-o na fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim" (Gal 2,19-20): eis o Homem Novo, formado em Paulo, o Homem que tomou conta de todo o seu existir; eis o Homem Novo que procuramos seja o fruto da educação cristã!

É por isso que a educação é um risco. Ela faz nascer a atitude de fé — quer dizer: o pensar, sentir, viver, existir a partir de Jesus e com Ele — em cada educando. E a fé jamais dá a sua forma a alguém sem a liberdade e sem a caridade. Não existe educação cristã sem estes três factores: a firmeza da fé, a ousadia da liberdade, a profecia da caridade.

O educador apenas pode propor um estilo de vida; apenas pode mostrar como, na sua pessoa, o Evangelho se tornou uma nova luz para entender e viver os problemas do mundo — desde os mais profundos e filosóficos aos mais simples exercícios matemáticos. Apenas pode despertar no educando o desejo de, também ele, chegar a viver do Homem Novo, e oferecer-se para seu companheiro de caminho — quais discípulos de Emaús, deixando que o Ressuscitado nos acompanhe, dê nova luz à vida com as palavras da Escritura, entre e permaneça na própria casa que é o coração de cada um.

4. É, certamente, merecedora de admiração a tarefa de ensinar a ler, a contar; a tarefa de abrir horizontes novos, mundos diferentes a uma criança que nos é confiada. Que seria do nosso mundo, da nossa sociedade madeirense, se não contássemos com quem o fizesse? Como estaríamos ainda presos na insularidade, na tristeza do mar infinito! Mas que seria desta mesma sociedade madeirense, sem alguém que nos abrisse a forma do Homem novo que é Jesus? De que nos serve saber a raiz quadrada ou a teoria da relatividade, sem sermos capazes de viver como seres humanos e, o que é mais (infinitamente mais), sem trazermos em nós o Espírito de Jesus — o verdadeiro Espírito do Senhor, único a poder renovar a face da terra?

O congresso que amanhã tem início celebra o centenário da chegada a esta Ilha da Congregação das Irmãs da Apresentação de Maria. Mas há-de procurar, igualmente, ir mais longe: partilhar experiências, abrir novos caminhos, olhar o futuro da humanidade que queremos. Nessa procura, não deixemos nunca de ter como ponto de referência a pessoa de Jesus, o Homem novo. Ou, se quisermos, não deixemos de assumir como critério a frase de S. Paulo que acabámos de escutar: "O que tem valor é a nova criatura".

+ Nuno, Bispo do Funchal