Domingo de Ramos

05-04-2020

DOMINGO DE RAMOS NA PAIXÃO DO SENHOR

5 de Abril 2020


Caros irmãos,

1. O Domingo de Ramos é uma espécie de pórtico de entrada da Semana Santa: somos colocados diante do amor de Deus que se manifesta na morte e na ressurreição do Senhor para que, ao longo da semana, possamos ir vivendo e crescendo no acolhimento do que significa hoje ser cristão.

Com efeito, no Domingo de Ramos, somos, por um lado, confrontados com a morte de Jesus, com a Sua Paixão; e, por outro lado, somos também convidados à aclamação e à alegria, reconhecendo naquele Crucificado a vitória de Deus - que o mesmo é dizer: a vitória do amor e da vida.

Como vamos, pois, viver esta Semana Santa? Vamos vivê-la, antes de mais, como Jesus a viveu, acompanhando-O, colocando-nos no seu seguimento. O mesmo é dizer: vamos vivê-la como discípulos. A isso nos convidava o Profeta Isaías.

Na Iª Leitura que escutámos, Isaías falava antecipando de vários séculos a figura de Jesus conduzido à Paixão: "Apresentei as costas àqueles que me batiam e a face aos que me arrancavam a barba; não desviei o meu rosto dos que me insultavam e cuspiam" (Is 50,6). Mas não o faz sem antes ter descrito a figura do Servo de Deus como um "discípulo": "O Senhor deu-me a graça de falar como um discípulo, para que eu saiba dizer uma palavra de alento aos que andam abatidos. Todas as manhãs Ele desperta os meus ouvidos, para eu escutar, como escutam os discípulos" (Is 50,4).

Jesus é apresentado na figura de discípulo. Discípulo de quem? Discípulo do Pai. Ele próprio o disse de Si mesmo: "O meu alimento é fazer a vontade de meu Pai" (Jo 4 )

2. Do mesmo modo, também nós, esta semana, somos convidados a assumir a atitude do discípulo. Todos os dias e o dia todo - "todas as manhãs", diz Isaías, como que a dizer: desde o início do dia até ao seu fim. Quer dizer: ser discípulo de Jesus, aprender, acolher, perceber a vontade de Deus é uma tarefa constante e quotidiana. Ninguém se pode dizer cristão sem esta atitude diária. O discípulo é, antes de mais, aquele que está atento ao mestre, àquilo que ele lhe diz e ensina. Na vida cristã, não somos mestres. Somos todos discípulos. Por isso, havemos de escutar. De escutar o Mestre.

Mas o profeta convidava também a uma outra atitude: "O Senhor deu-me a graça de falar como um discípulo, para que eu saiba dizer uma palavra de alento aos que andam abatidos" (Is 50,4). Falar como discípulos. Isso significa, antes de mais, que aquilo que dizemos, as atitudes que tomamos (porque também falamos com atitudes) não hão-de ter origem em nós mas em Jesus, o Mestre. O discípulo que fala como discípulo é aquele que diz o que escutou ao seu mestre. O discípulo que vive como discípulo é aquele que procura viver como o Mestre. Esta semana havemos de a viver como Jesus escutando e falando, quer dizer: vivendo.

3. Havemos de a viver, de um modo concreto, nesta Semana Santa que hoje começa, e no meio dos condicionalismos que estamos a viver.

Havemos de escutar como discípulos. Isso significa ler e meditar as leituras, procurando aquilo que elas nos dizem - e sempre nos dizem e ajudam. Ler as leituras diárias da liturgia em família, e procurar que todos os membros da família partilhem aquilo que o Senhor lhes diz. Escutar como discípulos significa procurar viver todos os dias a Eucaristia, transmitida pela Internet, da nossa paróquia ou de um qualquer outro lugar. E cada um, no silêncio do seu quarto, havemos de procurar escutar aquilo que o Senhor diz para a nossa vida, deixando que a Sua Palavra ressoe no nosso coração.

E, nesta semana, havemos também de falar, de viver como discípulos. Como faria Jesus se estivesse comigo em casa, agora, a viver com estes irmãos e com estes pais? Que atitude gostaria Ele que eu tomasse; que palavras gostaria Ele que eu dissesse?

Um jornal quotidiano narrava ontem a história de uma família espanhola com onze filhos, todos infectados com o Coronavírus. "Já houve 'momentos de verdadeiro medo' mas, com sorrisos na cara, contam que 'a Fé os tirou do poço' ".

"Tivemos de nos organizar como qualquer outra família. Ou planeamos ou naufragamos. Além disso, recebemos muita ajuda constantemente, diz José. [...] A família conta que, durante estes dias que atravessam, uma das principais coisas que ajudou foi acompanharem a missa pelo YouTube. Todas as manhãs, o casal afirma que a primeira coisa que faz quando acorda é acompanhar por vídeo em stream uma missa de Madrid. Os mais novos não acompanham tanto, mas os mais velhos já os secundam neste momento. 'Ajuda a estruturar o dia, dá-nos paz e bom humor', diz José. À tarde, rezam todos o rosário. Para a Páscoa, já planeiam acompanhar o Papa Francisco pela televisão" (Manuel P. Machado, Observador, 03/04/2020).

Procuremos, também nós, acompanhar de mais perto o Senhor, deixar que Ele venha, que Ele esteja presente em nossa casa e em nós, no nosso coração. Disponhamo-nos a escutar como escutam os discípulos e a falar, a viver como discípulos, sabendo que a morte não tem - em Jesus como em nós - a última palavra. Essa pertence - e pertencerá sempre - ao Deus vivo que nos ama a todos como Pai.

+ Nuno, Bispo do Funchal