Domingo de Páscoa 2023

09-04-2023

DOMINGO DE PÁSCOA

Sé do Funchal, 9 de abril de 2023 (A)

1. "Que hei-de fazer com Jesus, chamado Cristo?" Esta interrogação de Pilatos

tem-nos acompanhado ao longo desta Semana Santa, provocando-nos a uma

resposta não apenas do pensamento mas de toda a nossa existência. Parece,

no entanto, que hoje, Domingo de Páscoa, aquela interrogação deixa de fazer

sentido: Jesus desapareceu, o túmulo ficou vazio! Que podemos fazer com

um vazio?

É esta mesma aflição (este vazio) que leva Pedro e João a correrem ao

sepulcro. Com Jesus vivo, sabiam o que fazer. E com Jesus morto, sepultado,

também: tinham os seus restos mortais, podiam viver das memórias... Mas

com um ausente, tudo fica definitivamente perdido! Pedro e João correm —

quase parecem dois atletas a ver quem chega primeiro! — correm, logo que as

mulheres lhes comunicam: "Levaram o Senhor do sepulcro, e não sabemos

onde O puseram!".

Move-os a aflição. Não bastava o sem-sentido da morte, quanto mais, agora,

um vazio! E, de facto, ali estavam as ligaduras e o sudário "enrolado à parte",

diz o evangelista, como que a insinuar que, longe de ser um acaso, tudo tinha

acontecido de acordo com um desígnio...

2. Mas o "discípulo amado", diz ainda o evangelista, "Viu e acreditou": viu o

vazio do sepulcro; viu as ligaduras; viu o sudário enrolado; viu a aflição no

rosto de Pedro. Mas João teve a ousadia de, confrontado com a Páscoa de

Jesus, percorrer um caminho novo (aquele a que Jesus o tinha desafiado ao

longo dos três últimos anos): "viu e acreditou".

Para João, os sinais eram os mesmos que para Pedro e para as mulheres, e

para tantos outros que se dirigiram, naquele dia, ao sepulcro. Mas João "viu e

acreditou". A diferença provinha dos "olhos da fé" — porque a fé dá um olhar

diferente sobre tudo, o "olhar de Jesus"! E foram os olhos da fé que lhe

permitiram ver mais longe e perceber o significado real do que tinha

acontecido naquele lugar, naquele "primeiro dia da semana" — naquele

primeiro dia da nova criação! Foi desse modo que a ausência desapareceu, e

a Presença se tornou bem maior que outrora: uma presença de Jesus, bem

mais forte e significativa.

Acreditar é perceber esta Presença. Ter fé cristã é perceber esta Presença:

vemos os mesmos sinais que todos; mas longe de reconhecer uma ausência,

a fé percebe uma Presença, a Presença do Senhor ressuscitado, vivo. Uma

Presença real, não um fantasma, um espírito ou uma energia vaga que nos

domina e incomoda!

Confrontados com os acontecimentos da Páscoa, os olhos da fé reconhecem

uma Presença. Uma Presença que nos conhece intimamente. Uma Presença

que nos ama e nunca nos abandona. Uma Presença que nos envolve e nos

torna livres. Uma Presença que nos faz caminhar, que urge em nós e nos

desinstala. Uma Presença que nos oferece um novo horizonte de vida e nos

aponta a meta do existir. Uma Presença que é Caminho e nos acompanha.

Uma Presença que nos oferece o sentido da história e do mundo. Uma

Presença que faz surgir uma nova comunidade, a Igreja — nova porque não é

o fruto de vontades humanas que se congregam, mas iniciativa do Espírito do

Ressuscitado que une todos aqueles que se deixam transformar pela fé. É

esse olhar que permite ver mais longe e de um modo mais profundo e

verdadeiro — "caminho, verdade e Vida"!

"Viu e acreditou". Depois de João, também todos os outros discípulos fizeram

esse percurso. Mesmo Tomé, que inicialmente duvidou (que bom foi que

tivesse duvidado!). E, depois deles, também Paulo e tantos outros... Tantos,

que permitiram à Presença do Ressuscitado mostrar-se ao mundo inteiro e

chegar até nós.

Esse é o caminho da fé: longe de ser um sentimento vago ou o fruto de um

raciocínio elaborado, a fé é antes a percepção da Presença de Jesus

ressuscitado que se nos impõe como evidência primeira, e que nos oferece a

razão, o sentido de tudo o resto — o sentido da nossa vida e da vida do

mundo. "Viu e acreditou": a partir deste momento, tudo passou a fazer

sentido. E a vida do discípulo transformou-se, converteu-se.

"Que hei-de fazer com Jesus chamado Cristo?". Hoje, como naquele

momento, a resposta que somos convidados a dar é semelhante à de S. João

na manhã do primeiro Domingo de Páscoa: "Viu e acreditou"!

Que hei-de fazer de Jesus, chamado Cristo? "Vê e acredita!". Que o mesmo é

dizer: vê o mundo que te rodeia, a vida que te foi oferecida — podem parecer

vazios e sem sentido, como o sepulcro vazio, mas deixa que os olhos da fé te

façam descobrir a Presença do Ressuscitado! Vê, e deixa que a tua vida seja

por Ele transformada, ressuscitada!


+ Nuno, Bispo do Funchal