Homilia no Domingo de Ramos 2023

02-04-2023

DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR

2 de Abril de 2023

Sé do Funchal


"Que hei-de fazer de Jesus, chamado Cristo?"

1. "Que hei-de fazer de Jesus, chamado Cristo?" Esta questão dramática, colocada por Pilatos à multidão, e que reduz o Nazareno a um objecto incómodo, de quem todos se querem libertar é, ainda hoje, uma questão que nos é colocada. A nós e a toda a nossa sociedade. Que fazer de Jesus? Que fazer deste Jesus que nos incomoda — porque o seu Evangelho continua a incomodar; porque a sua vida e a sua proclamação do lugar central de Deus, sem olhar às opiniões, às interpretações, ou ao poder dos sábios ou dos poderosos, continuam a incomodar; porque a sua palavra que ultrapassa a superficialidade com que nos habituámos a viver, continua a incomodar. Que fazer com Jesus?

A resposta dos discípulos é, em grande parte, a sonolência — aquele mesmo sono da noite anterior, quando foram incapazes de vigiar com o Mestre, de o acompanhar na luta para dobrar a vontade humana à vontade do Pai e ao sofrimento que se adivinhava. Judas já O tinha entregue; Pedro, nega conhecê-lo.

O Sinédrio — tribunal que regulava a vida judaica naquele tempo — não hesita em condenar Jesus por blasfémia, "porque sendo homem se fez passar por Deus": "É réu de morte".

A multidão que, dias antes, tinha aclamado o Senhor como Messias, sentido-se defraudada nas suas expectativas, não hesita em responder do mesmo modo com que hoje grita nas redes sociais: "Crucifica-o".

Os soldados ironizam com mais um condenado à morte infame, objecto de escárnio e de divertimento nas suas mãos.

Pilatos, lava as mãos. Habituado a julgar e a condenar, pressionado por todos, Governador romano, político e militar experimentado, teve, naqueles momentos em que se viu de frente a Jesus, a intuição de que se encontrava perante uma situação de todo anormal. Talvez por isso, tenha pretendido aliviar responsabilidades, diante do que parecia inevitável: a condenação à cruz daquele homem, humilde carpinteiro de Nazaré, mas responsável por uma semana agitada em Jerusalém — seja por causa da sua entrada triunfal na cidade, seja por ter sido responsável por vários momentos de distúrbio no Templo durante aqueles dias que antecediam a Páscoa.

2. "Que hei-de fazer de Jesus, chamado Cristo?". Quase dois mil anos depois, ao escutarmos hoje a questão de Pilatos, podemos entendê-la apenas como uma "curiosidade histórica". Biblistas, teólogos, historiadores, juristas e tantos outros (crentes ou não) escreveram milhares de páginas sobre a culpa da condenação de Jesus: para uns, foram os judeus (culpados de não reconhecer o Messias, de coração duro, incapazes de se converterem, mesmo diante do Deus feito homem); para outros, foram culpados os romanos (potência ocidental ocupante, gente sanguinária e sem piedade)… Artistas, fizeram dele objecto para pinturas, para música e para o cinema…

Mas não é como curiosidade histórica que a questão de Pilatos hoje nos importa: "Que hei-de fazer de Jesus, chamado Cristo?". Ou melhor: e tu? Diante deste Jesus como colocas tu a tua existência? Se ali estivesses, naquele lugar (como certamente já pensaste que gostarias de ter estado, a presenciar todos estes acontecimentos que constituem o centro da história do mundo) — se ali estivesses, no meio da multidão, como te comportarias? Que resposta darias a Pilatos? Que fazes tu hoje, na tua vida, deste Jesus chamado Cristo?

Sim, tu que recebeste o Batismo em seu nome, e com ele a vida nova do Ressuscitado, que fazes tu de Jesus? Tu que fizeste a Primeira Comunhão, que andaste na catequese e recebeste o Seu Espírito no sacramento do Crisma, que fazes tu de Jesus? E tu que participas diariamente na Eucaristia, que fazes tu de Jesus? E tu que abandonaste a fé mas que olhas para Jesus com alguma admiração, que fazes tu de Jesus? E tu, que gostarias de acreditar mais profundamente, que procuras o sentido da tua vida, que fazes tu de Jesus?

Outrora, a resposta a esta questão determinou a vida ou a morte de Jesus: "Crucifica-o!". " [Pilatos] soltou-lhes então Barrabás. E depois de ter mandado açoitar Jesus, entregou-lho para ser crucificado".

Mas hoje, esta mesma resposta determina, não já a vida de Jesus mas a tua vida — que o mesmo é dizer: determina a tua vida ou a tua morte! Porque dela depende se partilhas a vida com Jesus (a vida eterna), ou se te contentas com a morte que o mundo te oferece, ainda que disfarçada de vida. E não penses em "neutralidade": a indiferença diante do Deus feito Homem é já uma resposta!

"Que hei-de fazer de Jesus, chamado Cristo?". Que fazes tu de Jesus?